terça-feira, 14 de maio de 2013

Saudades das minhas férias.....

Final de fevereiro de 2013. Após voltar da cobertura das primeiras audiências do caso New Hit, na cidade de Ruy Barbosa, senti vontade de criar um blog e inaugurá-lo com um post sobre os bastidores dessa peleja. Veio as férias, pensei que arranjaria tempo para escrever, mas........... Foram dois meses de férias. Me desliguei do mundo. Nos últimos dias, o caso New Hit voltou à tona, primeiro no show que eles fizeram em Salvador na Ed10 e agora o caso no Profissão Repórter. Voltou a vontade de criar o blog, para não encher tanto o saco do povo no Facebook quando eu quiser desabafar. Voltou a vontade de falar da cobertura do caso New Hit. (se bem que me lembro de fevereiro e já me dá saudades das minhas férias....vou chorar. Kkkkkk). Vamos lá.

Pensem bem. Eu estava em fevereiro, faltavam menos de 10 dias para as tão sonhadas férias, eu já tirando o pé do acelerador, quando a minha mamãe de gêmeos e querida editora Izabela me liga informando que eu fui o 'escolhido' para viajar até Ruy Barbosa, pois começaria o julgamento da New Hit. Mesmo um pouco cansado, me empolguei com a viagem, sabia que teria uma repercussão imensa, a imprensa toda estaria lá, enfim, um desafio imenso para qualquer jornalista, além de fugir da tradicional rotina de encarar o submundo da violência na cidade.
Eu viajei às 4h da madrugada de uma segunda-feira, sendo que trabalhei no domingo até umas 9h da noite.

A equipe era eu, o repórter fotográfico Joá Souza, e o motorista Valdeck Como não tinha feito as malas, praticamente não dormi. Chegamos em Ruy Barbosa 8h30 de segunda, com a cidade pegando fogo, grupos feministas protestando na porta do fórum, advogados, policiais, batalhão de repórteres. Só foi o tempo de deixar a mala no hotel e trabalhar quase sem parar até quase 10h da noite.
Desde que recebi a missão, coloquei na mente que o meu maior desafio seria entrevistar as duas adolescentes que acusam os músicos de estupro. Tentei de todas as formas, liguei para todo mundo que podia me ajudar, insisti na porta do fórum, mas era impossível: elas estão em um programa de proteção e não falam nem com alguns dos familiares. Insistia em entrevistar as duas porque já havia entrevistado os músicos, e também entrevistei o PM que também é acusado, entrevista feita enquanto ele estava preso.

Tenho a consciência tranquila que sempre ouvi todos os lados, sem tomar partido, os próprios advogados dos músicos reconhecem, quando o jornal "deu porrada", não foi à toa, foi com fatos concretos. E os músicos tiveram amplo espaço, só não teve quem não aceitou ser entrevistado. Aqui começa o meu drama. Eu, repórter de jornais impressos, me via perdido no primeiro dia tendo de competir com dois sites que atualizavam em tempo real qualquer novidade que acontecia na porta do fórum. Quando chegou no final do dia, não havia mais uma novidade para contar no jornal do dia seguinte. E eu perdido sem entrevistar as meninas, que seria um material importante, já que elas eram as principais pessoas a serem ouvidas durante essa etapa do processo.



Reprodução / Facebook de Júnior Silva

Na porta do fórum, tirando as feministas, o que mais eu ouvia era: "Essas meninas são umas putas, vieram de outra cidade para queimar a gente". "Elas queriam fuder com eles sim, e depois se fazem de vítimas". Eram frases comuns, recorrentes na cidade toda, meninas, velhos, mulheres. As pessoas não se davam nem ao direito da dúvida: será que eles realmente não cometeram o estupro. Sou jornalista, não julgo. Minha obrigação é apenas duvidar e perguntar, a todos os lados, sem preconceitos e sem achismos. Em uma das noites, quando os músicos saíram do fórum, um grupo de adolescentes cercou os rapazes, abraçaram e beijaram eles com todas as forças. Imagine eu vendo essa cena. Me sentia um babaca.

Trabalhando de 7h da manhã até 22h, sem almoçar direito, conversando com fontes até de madrugada, na cidade, e vendo que os moradores locais não se permitiam nem o benefício da dúvida. Era como se eu perdesse a esperança no ser humano. Não vou dizer que os músicos são culpados. Eles são réus em um processo de crime hediondo. Não podem ser condenados antecipadamente, mas também não podiam ser idolatrados como heróis. Só pensava nisso.
Daí que começou uma outra batalha. Conseguir saber o que as jovens contaram nos depoimentos. Num misto de sorte e muita chateação nas mentes alheias, conseguimos os depoimentos das jovens, com exclusividade. Ressalto a ajuda fundamental de Joá Souza, sem ele nada teria sido feito. O jornal publicou trechos dos depoimentos. Foi um divisor de águas.

Levei muita porrada, muitas críticas, gente dizendo que não era para publicar esses depoimentos, pois foi chocante demais. Assessorias de todos os lados querendo saber quem tinha vazado os depoimentos para gente. Muitos elogios também, muita gente parabenizando por mostrar o lado das vítimas. Diante desse histórico do que vivia na cidade, a minha intenção era mostrar a versão das vítimas. E os relatos eram muito duros. Sou ser humano, tenho irmãs, mulher, amigas, primas, ler aqueles depoimentos era de revirar o estômago. O meu objetivo era mostrar esse lado da história. Pode ser mentira? Pode. As meninas podem estar contando lorotas? Podem sim! Também não tenho o poder de julgar. Só me interessam os relatos. Se provocou choque, não é culpa da imprensa, e sim culpa dos agressores, se o fato for verdade. Se os relatos forem verdadeiros, talvez quem defenda a banda repense um pouco, meninas não percam tempo indo à porta do fórum enquanto duas outras adolescentes não podem nem ver televisão, estão com a vida detonada, longe das raízes, dos amigos, da vida. Sou a favor do equilíbrio: não dá para crucificar acusados, como não podemos colocá-los no altar dos deuses. Informalmente, uma pessoa ligada a alguns músicos e que assistiu aos depoimentos me falou o seguinte: durante o depoimento de uma das adolescentes, ela sentia o sofrimento nos olhos da garota, enquanto ela relembrava, os olhos mostravam a dor de viver tudo aquilo novamente. Os relatos eram muito conectados, me disse a mesma fonte.

Foram três dias de cobertura. Parece que fiquei um mês fora, de tão intenso que foi. Bastidores e aprendizado que dariam páginas de livro. A maior lição: duvide de todo mundo, não banque a versão de ninguém. Se você for honesto no texto, até quem está mal falado vai reconhecer que você é correto.
Para quem chegou até aqui, haja paciência. Me perdoe. E só tenho a agradecer.